Entre memes e fofocas, saem conversas profundas entre minha amiga Adriane e eu. Ela, urbanista no diploma e na essência, eu, arquiteto, discutimos sobre construções, mas sobretudo acerca de cidades. Sua crise mais recente inclui críticas à nova geração de prédios dos bairros “cool” de São Paulo, principalmente os da Vila Madalena, onde cada lançamento clama para si o título de novo ícone da região.
Projetos de fato arrojados, bem resolvidos e bem executados, mas se em uma mesma zona há vários ícones, não estariam de fato todos berrando e ninguém se ouvindo? É isso que diz Luiz Villanova quando chama esta competição entre monumentos não monumentais de “zoológico de elefantes brancos”.
Adriane defende, com razão, que nem todo projeto precisa gritar, inovar ou destacar-se da multidão. Questiona os incorporadores e projetistas que deixam seus egos se sobreporem a um harmônico conjunto espaço-visual urbano. Paris, Nova York, Buenos Aires, Barcelona, Londres e também áreas históricas das cidades coloniais brasileiras, como Salvador, Tiradentes, Paraty e até mesmo a charmosa vila de Trancoso não carecem de mais símbolos e monumentos. O equilíbrio entre a homogeneidade volumétrica das construções e um traçado urbano que não ignora espaços públicos permite que surjam monumentos que se destacam na paisagem e se tornam verdadeiros referenciais de localização ou até mesmo da cultura local, como a Torre Eiffel ou a Sagrada Família de Gaudí.
Aldo Rossi, Denise Scott-Brown e Robert Venturi, grandes teóricos da arquitetura, coincidem na crítica à abstração total defendida pelos princípios modernistas. Essa abstração formal refletiu fortemente tanto na trama do tecido urbano quanto nas edificações que compõem as cidades desenvolvidas ao longo dos séculos XX e XXI. O resultado está à plena vista: nossas cidades tornaram-se ilegíveis. Clamam por prédios neutros, momentos de silêncio numa sinfonia caótica que se tornaram.
*Coluna publicada da edição impressa do dia 07 de setembro de 2024
*A opnião dos nossos colunistas não refletem, necessariamente, a opnião do jornal página d.
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