No final do século XIX, Santa Cruz do Rio Pardo foi palco de um crime tão grotesco que ressoa até os dias de hoje na memória de quem estuda a história da cidade: o "Crime da Mãozinha". Este caso, que envolveu a morte brutal de uma criança, não apenas chocou a população, mas também expôs as contradições do sistema judicial da época, subserviente ao poder econômico e influência política.
O crime aconteceu em 1893, quando Marianna Amélia Freitas Pinto Mello, uma rica fazendeira, descobriu a traição de seu marido, José Gonçalves da Silva. O relacionamento extraconjugal com Pureza, uma jovem afrodescendente, resultou no nascimento de uma criança, despertando a ira de Marianna. Impulsiva e movida por um desejo de vingança, ela contratou assassinos para eliminar tanto a amante quanto o filho.
Após a execução, os assassinos entregaram a Mariana não apenas a mão da criança, mas também seu coração, que foram macabramente pregados na parede do quarto onde ela dormia com o marido. Essa ação chocante simbolizava uma obsessão doentia e uma tentativa de controle absoluto sobre a vida de José.
Valdomiro Silveira, o promotor responsável pelo caso, apresenta-se como um defensor da justiça, mas suas ações até hoje suscitam debates entre pesquisadores. Enquanto alguns relatos o descrevem como impetuoso e firme em sua acusação, outros indicam uma trajetória marcada pela hesitação e eventual desilusão. Após enfrentar a mandante e recusar subornos, Valdomiro acabou se afastando da comarca, alegando motivos pessoais. Essa saída é vista por muitos como um sinal de fraqueza, levantando questões sobre sua real coragem e integridade.
Os biógrafos de Valdomiro enfatizam sua postura firme durante o julgamento, mas as evidências de sua eventual exoneração e a absolvição da mandante lançam dúvidas sobre sua eficácia e resistência diante da corrupção.
Poder
Marianna Amélia não era apenas uma fazendeira influente; ela era descendente de famílias ricas e poderosas e, entre seus filhos ilustres, está o coronel Francisco Clementino Gonçalves, mais conhecido como Coronel Clementino Gonçalves, figura proeminente em Santa Cruz, cujo nome é homenageado em uma das principais avenidas da cidade. A conexão familiar de Marianna com figuras de autoridade e influência político-social lhe conferia um poder que, em última análise, parece ter garantido sua impunidade. Ela foi inocentada pelo júri.
Porém, após o crime, Marianna caiu em um ciclo de alcoolismo e desespero, o que talvez evidencie a fragilidade de sua psique após o ato horrendo que cometeu. A tragédia da criança e a brutalidade do crime a levaram a um fim trágico; ela morreu em um incêndio acidental, causado por um lampião que tombou enquanto dormia.
Um detalhe importante no enredo do "Crime da Mãozinha" é o destino de Pureza, a mãe da criança. Diferentemente do que se poderia imaginar, ela sobreviveu ao crime, escapando da morte. Foi poupada, tendo que conviver com a perda dilacerante do filho.
Esta reportagem foi baseada no acervo dos memorialistas Celso e Junko Celso Prado que pode ser acessada através do site.
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