Durante os depoimentos realizados nesta quinta-feira (21) a oitiva da servidora Elisandra Cristina Ziloti, uma das responsáveis pela auditoria dos procedimentos do ProBem, foi um dos mais relevantes na sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga possíveis irregularidades no programa de bem-estar animal de Santa Cruz do Rio Pardo. Suas declarações trouxeram à tona falhas graves na elaboração de contratos, execução de serviços e fiscalização de pagamentos, revelando um cenário de desorganização e falta de controle. Além disso, outro depoente, Reginaldo Donizetti Batista, acusou o veterinário Kaio da Venda de "sumir" com o seu cachorro.
Ao longo do dia, depuseram Reginaldo Donizetti Batista, Rosângela Aparecida Pereira, Elizete Tavares Rocha, Elisandra Cristina Ziloti, Eliana Maria Scarpin e Daisy Martins Amorim. O depoimento de Thaisa Mayara Salandin também estava agendado, mas ela não compareceu devido a problemas de saúde.
Elisandra detalhou aos membros da CPI as dificuldades geradas pelo contrato inicial do programa, que estava atrelado a uma tabela de procedimentos que ela classificou como "insuficiente e falha". Segundo a servidora, a tabela não contemplava adequadamente os serviços necessários, gerando questionamentos sobre como os veterinários aceitaram assinar o contrato sem exigir ajustes. "Me admiro muito deles terem assinado sem se atentar a isso. A tabela não contemplava nada, e mesmo assim eles aceitaram realizar os serviços", declarou. O relator da CPI, Fernando Bittencourt, também criticou a tabela, considerando-a "ridícula" e apontando que as falhas poderiam ter sido corrigidas antes da assinatura do contrato.
Outro ponto destacado foi a aprovação de uma segunda lei, que permitiu a realização de procedimentos fora da tabela inicial mediante autorização da Secretaria do Meio Ambiente. Bittencourt explicou que essa lei não foi vinculada a um novo contrato ou termo aditivo, agravando a insegurança jurídica para os profissionais. "Não houve um contrato atrelado a essa segunda lei. Tudo continuou sendo feito de forma informal, muitas vezes por WhatsApp", afirmou.
A auditoria em andamento já identificou diversas irregularidades, sendo os casos de internação e curativos os mais emblemáticos. Elisandra explicou que, no contrato, a internação é tratada como um único período de tratamento, sem especificação de diárias, mas que foram identificadas cobranças baseadas em múltiplos dias de internação, algo incompatível com os termos previstos. "Cobrou-se 20 diárias de internação, mas o contrato prevê um valor único, independentemente do tempo de internação", afirmou.
Ela também apontou problemas relacionados aos curativos, que, segundo a tabela, deveriam ser pagos por animal atendido e não por cada procedimento realizado. "Por essa tabela, mesmo que estivesse tudo descrito e comprovado, não seria pago. Ela é muito falha", pontuou o relator.
"Nem a prefeitura, nem os veterinários, nem ninguém teve essa interpretação do contrato. Tanto que muitos valores já foram pagos! E aí, como ficam os valores que já foram pagos? Vão devolver? Quem se responsabiliza? Acredito que não seriam os veterinários a se atentar a isso, até porque eles não podem fazer contrato, mas sim a prefeitura", complementou Fernando Bittencourt.
Outro problema apontado foi a ausência de prontuários detalhados, o que dificulta a comprovação dos serviços realizados. Elisandra destacou que a falta de registros adequados afeta tanto a administração pública quanto os profissionais, já que prontuários claros e organizados poderiam oferecer respaldo para ambas as partes. Apesar disso, afirmou: "Até o momento, não houve glosa, mas estamos apontando irregularidades e inconsistências que precisam ser corrigidas."
Durante o depoimento, houve discussão sobre as responsabilidades pelos problemas. Elisandra afirmou que cabia à administração pública elaborar contratos mais claros e realizar os ajustes necessários, mas também ressaltou que os veterinários poderiam ter sugerido mudanças antes de assinarem o contrato. "O contrato foi mal elaborado, mas não acredito que tenha sido por má-fé. Foi falta de conhecimento de quem o elaborou", concluiu. Bittencourt também questionou como um contrato com tantas deficiências foi aceito e sugeriu que a falta de uma revisão jurídica adequada contribuiu para o cenário atual.
O depoimento revelou a precariedade no controle e fiscalização do ProBem, com contratos mal formulados, ausência de termos aditivos para procedimentos adicionais e autorizações informais criando um ambiente de insegurança jurídica e administrativa.
“Sumiço” de cachorro
Em depoimento à CPI, Reginaldo Donizetti Batista fez graves acusações contra o veterinário Kaio da Venda, afirmando que o profissional teria "sumido" com o seu cachorro, um pitbull.
Reginaldo relatou que, em abril de 2023, recebeu uma ligação informando que Kaio havia publicado nas redes sociais uma denúncia de maus-tratos contra ele. "Ele fez as denúncias nas redes sociais, alegando que eu estava maltratando meu cachorro, que havia sido encaminhado para a clínica dele pelo ProBem. Quando entrei em contato com ele por telefone, Kaio estava em Sorocaba, pediu desculpas e retirou a postagem", explicou Reginaldo, destacando que as acusações feitas por Kaio foram sensacionalistas.
Dias depois, Reginaldo contou que foi até a clínica para retirar seu cachorro, mas foi impedido de entrar por Kaio. Segundo ele, o veterinário alegou que o pitbull estava em estado de saúde muito debilitado, com anemia profunda, e que precisou de uma transfusão de sangue. Reginaldo não conseguiu ver o cachorro e deixou o local. Horas depois, Kaio ligou informando que o animal havia falecido durante a madrugada – ou seja, antes da primeira conversa deles na clínica. Reginaldo retornou à clínica, onde viu o cachorro, mas se recusou a tocá-lo, pois estava muito transtornado.
Após algum tempo, Reginaldo recebeu áudios de uma amiga nos quais Kaio sugeria doar o cachorro. "Fiquei em choque, não consegui acreditar no que estava acontecendo. Não sabia mais se o cachorro estava realmente morto", contou. Ele voltou à clínica, mostrou os áudios a Kaio e pediu para tocar no animal, mas foi novamente barrado. "Chamei a polícia, e quando entrei, o cachorro estava em outra posição. Não consegui tocá-lo e fiquei transtornado novamente", relatou.
Após o incidente, Reginaldo registrou boletim de ocorrência e disse que Kaio começou a ligar oferecendo ajuda com outros animais. "Ele me ofereceu outro cachorro, como se quisesse me convencer a não seguir com a denúncia", afirmou.
Kaio, em depoimento, alegou que o pitbull estava magro devido aos maus-tratos, mas Reginaldo refutou essa versão. "O cachorro começou a adoecer, sim, mas eu já o havia levado a outros veterinários do ProBem e estava tratando-o com remédios e fígado. Mas ele continuava emagrecendo", explicou.
Reginaldo também negou as acusações contra ele, reforçando que sempre cuidou bem de seus animais, incluindo sete gatos e diversos animais de rua. "Nunca maltratei nenhum animal", garantiu. O depoente acusou Kaio de negligência, falta de ética e irresponsabilidade, além de afirmar que o veterinário fez injúrias e calúnias contra ele. "Ele agiu de má-fé", concluiu Reginaldo.
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