Aos 23 de novembro de 1889 a Câmara Municipal de Santa Cruz do Rio Pardo, em sessão extraordinária, tomava ciência do Golpe Militar de 15 de novembro, que derrubava a Monarquia e instituía a República, e assim se pronunciou do presidente do legislativo local, o deputado Emygdio José da Piedade, perante o público presente e os vereadores:
"Cidadãos! Está instituído o governo republicano brasileiro e funcionando o governo provisório do Estado de São Paulo.
Não podemos deixar de aderir ao movimento e à transformação do sistema, aceito e reconhecido até pelo governo deposto que entregou o Palácio, o Tesouro e Repartições Públicas sem opor contestação alguma. A nós que sempre sustentamos a monarquia enquanto ela pode manter-se, resta o dever, como brasileiros e patriotas, de cooperar com o governo atual para a manutenção da ordem e da paz, para o engrandecimento da Nação Brasileira, e para aumentar a garantia dos direitos e liberdade dos cidadãos; está assim, aceita e reconhecida a República Federativa dos Estados Unidos do Brasil e o Governo Provisório do Estado de São Paulo." (Câmara Municipal, Ata da Sessão, 23/11/1889, apud Aluisio de Almeida, 'O Vale do Paranapanema, Capítulo VI – A Terra e o Homem (...)', Revista do Instituto Histórico e Geográfico, 3º Volume, abril/junho 1960: 52-53).
Não houve protestos e incidentes de montas a exemplos de algumas outras localidades, inclusive na região. Os vereadores santa-cruzenses tomaram ciência do documento oficial que declarava, também já "(...) empossado o governo provisório do Estado de São Paulo (...)", composto pelos senhores dr. Prudente José de Moraes e Barros, coronel Joaquim de Souza Mursa e jornalista Francisco Rangel Pestana.
Emygdio José da Piedade, na condição de Presidente do Legislativo santa-cruzense, declinou o convite para a chefia da nova ordem, e sugeriu que ela fosse assumida por membros republicanos no município, liderados pelo vereador coronel Marcello Gonçalves de Oliveira. Emygdio não ignorava que os militares golpistas em nada se identificavam com o Partido Republicano, apenas adotaram a sigla.
Apresentou-se, então, o Coronel Marcello Gonçalves de Oliveira, como a nova liderança política municipal, e viu crescer seu prestígio a partir de 1890 com a efetiva instalação da Comarca, e a vinda de tradicionais famílias republicanas, capitaneadas pelo advogado e influente deputado federal, Dr. Antonio José da Costa Junior e, logo depois, o seu genro Francisco de Paula de Abreu Sodré.
Pouco depois o governo de São Paulo, com base no Decreto nº 107, de 30 de dezembro de 1889, dissolveu 121 das 134 Câmaras Municipais eleitas na província, agora estado paulista, e nomeou Intendentes para as localidades - os 'Conselhos Municipais de Intendentes'.
Entre os dissolvidos, Santa Cruz do Rio Pardo, cuja Intendência nomeada aos 17 de fevereiro de 1890, compondo o quadro Joaquim Manoel de Andrade, Moysés Nelly e João Evangelista da Silva, sendo o primeiro qualificado presidente e os demais na condição de membros. Também no rol, dr. Manoel Malta Leite de Araujo, como intendente procurador do município.
A despeito da Intendência o grande destaque político foi o coronel Marcello, identificado líder do Partido Político Republicano Paulista - PRP, que viria ocupar de cargos públicos por eleições - vereança e juiz de paz, e nomeações, como subdelegado de polícia, inspetor literário e comandante da Guarda Nacional local, nesta com participação na 'Revolução Federalista de 1892', com envio de voluntários santa-cruzenses (Correio Paulistano, 18/07/1894: 2 – referências).
O advento republicano tornou o coronel Marcello o 'prestigioso chefe político' perrepista local, até a primeira crise interna, optando por resignar-se do cargo (Correio Paulistano, 10/12/1890: 3), através de carta datada de 26 de novembro de 1890, por se sentir desautorizado com a demissão do promotor público local e o recolhimento do sargento comandante do destacamento.
O então tenente-coronel João Baptista Botelho, agente principal da queda de Marcello, assumiu o lugar, porém, não resistiu contragolpe acaudilhado pelos irmãos Antonio da Costa Junior - fazendeiro e deputado federal, e o dr. Augusto José da Costa - juiz de direito da comarca.
O coronel Marcello retornou ao quadro político em 1892, com sua equipe, no lugar de João Baptista Botelho e sectários; mas, João Baptista Botelho manteve-se Delegado de Polícia, e membro da Intendência Municipal, enquanto o coronel Marcello sustentava-se como o 'prestigioso chefe político'.
A importância de Marcello, à época, era notória. Aos 16 de julho de 1894, o coronel Marcello ofereceu, em sua residência, marcante recepção aos heróis santa-cruzenses da Revolução Federalista, com as presenças do juiz de direito da comarca, dr. Augusto José da Costa, e de outras autoridades. Marcello estava como o ilustre 'Comandante da Guarda Nacional local', e no ano seguinte, aos 30 de novembro de 1895, seu nome aparecia como '2º Juiz de Paz' (O Paranapanema, semanário santa-cruzense, 30/11/1895: 3).
Em sessão especial da Câmara, datada de 07 de janeiro de 1896, Marcello foi declarado eleito 'Juiz de Paz' (Câmara, Livro Ata). Posteriormente, aos 28 de novembro do mesmo ano, em sessão extraordinária, a Câmara enlutava-se pelo seu falecimento e homenageia-o com o nome de rua, Lei 143 de 03 de novembro de 1909, aquela que se 'inicia no Ribeirão São Domingo e chega ao Largo do Rosário', oficialmente denominado Praça Coronel Marcello Gonçalves de Oliveira, depois Praça 13 de Maio, conhecida como Largo São Benedito, até a denominação atual 'Praça Octaviano [Otaviano] Botelho de Souza' - Lei Municipal nº 689, de 14 de abril de 1976.
A administração Manoel Carlos Manezinho Pereira, desconhecendo a história santa-cruzense, mudou o nome da Rua Coronel Marcello Gonçalves de Oliveira para Travessa Otacílio Ramos - Lei Municipal 1471, de 22 de fevereiro de 1994. Hoje, nenhuma lembrança ou tributo resta ao coronel Marcello Gonçalves de Oliveira, dúvidas 'grande nome santa-cruzense', sem desmerecer os novos homenageados.
—Santa Cruz do Rio Pardo, assim, tornou-se município republicano coronelista, com certos reflexos dos tempos do Império, uma outra história—
*A opinião dos nossos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião do página d.
Mín. 19° Máx. 25°