O Ministério Público de Santa Cruz do Rio Pardo se manifestou oficialmente no inquérito que apura a utilização dos recursos da tabela SUS Paulista pela Prefeitura e sua transferência à Santa Casa local. A Promotoria, sob responsabilidade do promotor Marcelo Saliba, concluiu que o município usou de forma indevida valores que deveriam ter sido repassados integralmente à instituição hospitalar durante a gestão do ex-prefeito Diego Singolani.
Na manifestação, o promotor afirma que está “incontroverso” — ou seja, sem margem para dúvidas — que a Prefeitura reteve os recursos da tabela SUS Paulista, cuja destinação correta era exclusivamente à Santa Casa.
A tabela SUS Paulista é um complemento financeiro pago pelo governo do Estado de São Paulo a hospitais e entidades que prestam serviços ao SUS, com a finalidade de compensar a defasagem da tabela nacional. O recurso é considerado “carimbado” e deve ser transferido integralmente às entidades de saúde.
Na decisão, o promotor destaca ainda um possível conflito de interesses: o interventor da Santa Casa, João Zarantoneli, que também ocupa o cargo de secretário municipal, representa a Prefeitura — justamente a parte apontada como responsável pela retenção dos recursos. Por isso, Saliba entende que as medidas judiciais para ressarcimento devem ser adotadas não pelo atual interventor, mas sim pela diretoria da Santa Casa, que possui advogada própria.
“A diretoria da Santa Casa não pode se omitir na responsabilização da Prefeitura Municipal”, escreve o promotor. Ele acrescenta que o ressarcimento da Prefeitura à entidade deve ocorrer, e que o município, posteriormente, poderá buscar a reparação dos prejuízos junto aos responsáveis pelo ato — entre eles, o ex-prefeito Diego Singolani.
Segundo o MP, há procedimento próprio em tramitação na 4ª Promotoria de Justiça para apurar eventual ato de improbidade administrativa do ex-chefe do Executivo.
O Ministério Público determinou que o atual presidente da Santa Casa informe, no prazo de 30 dias, quais medidas a entidade pretende adotar para buscar o ressarcimento dos valores retidos. Um caminho possível seria um acordo com a prefeitura para o recebimento dos valores retidos. Se isso não acontecer, a Santa Casa deve acionar o município na Justiça.
A decisão foi encaminhada ao prefeito, à Câmara Municipal, ao Tribunal de Contas do Estado e à Secretaria de Estado da Saúde.
O inquérito segue aberto enquanto o MP acompanha as providências que serão adotadas pela diretoria da Santa Casa.
No final de 2024, a crise financeira da Santa Casa se agravou. O governo Otacílio afirmou, no início de 2025, que a situação foi motivada pelo não repasse dos recursos da tabela SUS Paulista pela administração anterior, estimados em R$ 580 mil por mês - cerca de R$ 5 milhões no total.
Na ocasião, o novo gerente administrativo da instituição, Lourival Pereira Heitor, afirmou que o valor deveria ter sido transferido integralmente pela Prefeitura à Santa Casa, o que não ocorreu.
Ele teria assumido a gestão da Santa Casa com dívidas a curto prazo na casa de R$ 4 milhões e um saldo de apenas R$ 700 mil em caixa. Cirurgias eletivas foram suspensas e médicos médicos ficaram sem receber salários desde o início do ano. A situação, segundo o governo, foi normalizada nos últimos meses.
Procurado nesta quarta-feira (9) pela reportagem do página d, o ex-prefeito Diego Singolani afirmou que ainda não havia tido acesso à manifestação do Ministério Público “Não houve retenção (dos recursos da tabela SUS Paulista). Os valores foram depositados na conta da Santa Casa. Importante destacar que todos os recursos foram utilizados para a realização de cirurgias eletivas. Eles foram repassados à Santa Casa. Agora, se o entendimento do MP é que o recurso teria que ser custeio pleno, é uma discussão entre a Santa Casa e o município. Porém, vou aguardar ter acesso ao conteúdo integral e responderei ao MP”, disse Diego.
A reportagem também entrou em contato com o departamento jurídico da Santa Casa de Misericórdia, mas ainda não obteve resposta.
Em resposta à reportagem, a advogada da Santa Casa de Misericórdia, Rosélis Dias, enviou a seguinte mensagem:
"Em resposta esclareço que a Santa Casa está respondendo ao MP , Dr Marcelo e Dr Abujamra. Quanto à devolução dos valores a solicitação já havia sido feita de forma
administrativa, antes do despacho do MP, mediante ofício da Intervenção protocolado perante a Prefeitura em 27/03 pp ratificado pela Diretoria atual. Isto se fez com amparo na legislação do SUS Paulista e em Parecer do Núcleo de Inteligência da Rede Assistencial (NIRA) da Secretaria Estadual de Saúde".
Leia na íntegra a manifestação do Ministério Público:
Salvo melhor juízo, o atual Presidente da Santa Casa não informou as medidas a serem adotadas contra a municipalidade para o integral ressarcimento aos cofres da entidade. As manifestações da municipalidade demonstram de forma incontroversa que não houve o repasse dos valores e que era obrigação do município os repasses, o que poderia, inclusive, ter posto fim ao procedimento de intervenção. O ofício do interventor direcionado à Secretaria de Estado também comprova a obrigação nos repasses, não deixando dúvidas que o município se apropriou dos valores em prejuízo da entidade.
Por outro lado, o interventor é Secretário Municipal e representa a Prefeitura Municipal, existindo conflito de interesses entre acionar a municipalidade e defender a Santa Casa. As medidas devem, portanto, ser adotadas pela Diretoria da Entidade, que inclusive conta com advogada própria. E, por fim, a Diretoria da Santa Casa não pode se omitir na responsabilização da Prefeitura Municipal (que depois irá, por seus próprios meios, ressarcir o eventual prejuízo aos cofres da municipalidade; na 4a Promotoria de Justiça há procedimento próprio para apurar ato de improbidade administrativa do ex-chefe do Poder Executivo).
O que o município deve avaliar é a possibilidade de reconhecimento administrativo do débito e acerto com a Santa Casa para os repasses, vez que não há dúvidas que os valores deveriam ser repassados integralmente e foram indevidamente usados para outros fins. Depois, buscar a reparação do prejuízo que suportou contra os autores do ato.
Assim, cobre-se informações ao Presidente da Entidade, com resposta em 30 dias.
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