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Frei Manuel: o “homem-deus” do Sertão – parte IV

Coluna Celso Prado e Junko Sato Prado

29/06/2025 às 16h53 Atualizada em 29/06/2025 às 16h57
Por: Colunista Fonte: Celso Prado e Junko Sato Prado
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Frei Manuel: o “homem-deus” do Sertão – parte IV

A denúncia do coronel de Campos Novos chegou à capital do Brasil, Rio de Janeiro, e o Ministro da Guerra ordenou medidas ao governo paulista. O 7º Batalhão foi enviado a São Pedro do Turvo para restaurar a ordem perturbada "por um pseudo missionário que, explorando a religião, tem fanatisado cerca de quinhentas pessoas" (Correio Paulistano, 26/05/1892: 1).

Nessa reportagem o Correio Paulistano informava, baseado em denúncia, que "esse missionário não passa de um cigano disfarçado em capuchinho e que tem cometido os mais abomináveis crimes naquela localidade". Na época havia forte preconceito contra os ciganos.

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O Governo do Estado de São Paulo, ao saber dos eventos no Sertão Paranapanema, enviou vinte soldados liderados por um tenente para capturar ou neutralizar 'Frei Manuel' e seus seguidores (José Ricardo Rios. Coronel Tonico Lista – o perfil de uma época, 2004: 21). Memórias indicam que havia agentes do governo infiltrados entre os seguidores do Frei Manuel.

Após a revolta em Campos Novos, liderada por um advogado traído e um coronel ferido, Frei Manuel sabia que estava em perigo. Ele se afastou com seus seguidores e permaneceu escondido por três ou quatro meses até ser encontrado e perseguido pela multidão que lhe era contrária.

O destino do profeta é um ponto de divergência entre historiadores. Bruno Giovannetti, em sua obra 'Esboço Histórico da Alta Sorocabana', informou:

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—"Era o mez de Setembro (...). O governo do Estado avisado do que se passava em Campos Novos, mandou soldados da Polícia para debandar os fanáticos e punir o autor de tamanha desorganização social. O encontro deu-se em São Pedro. Os soldados esperavam provavelmente encontrar resistência, porque o bando de aldeães estava armado. Frei Manoel [Manuel] nem sequer pensou em reagir. O Deus Homem, tombou ao chão, matado por bala de carabina" (1943: 80).

Nogueira Cobra, 'Em um Recanto do Sertão Paulista', comentou:

—"Em S. Pedro, para onde se dirigiu antes de vir a força do governo (...). Prevendo o desfecho de sua vida de aventuras, fugiu de S. Pedro para o mato, do lado do Ribeirão Bonito, e ali foi alcançado pelos civis que no seu encalço partiram. Recebendo vários tiros, caiu morto e junto dele o seu mais dedicado servidor" (1923: 112).

—Nogueira Cobra advogava em Campos Novos desde 1909, próximo aos fatos à exceção conhecida de Valdomiro Silveira, não diz a data exata dos acontecimentos, apenas menciona o ano 1892, e que o místico foi morto por populares instigados contra ele pelo coronel Francisco Sanches de Figueiredo e o jovem advogado Affonso Gonçalves Fraga, ambos 'campos-novenses'. 

Frei Manuel não foi simples fabulação do literato Valdomiro Silveira, afinal ele, como promotor público, lidou com o processo relacionado ao personagem, e foi o primeiro a escrever sobre os acontecimentos, além das publicações em jornais paulistanos de grande circulação, em cima de denúncias e correspondentes. Ainda assim, o Silveira, no original 'Eu, no Sertão', O Estado de S. Paulo, em colunas, 1906, posteriormente publicado pelo Diário Oficial do Estado de São Paulo - DOSP, Suplemento Leitura, em 15 de dezembro de 1982: 8-9 apresentou duas versões para o desfecho dos acontecimentos:

—"(...). A polícia entrou a incomodar o Joaquim Catirina de outrora, como se ele não fosse o aprontador de milagres e o sarador das moléstias mortais; e a onda de fiéis, corajosa mas prudente, pegou a oscilar e a flutuar dos bairros mais cidadãos para os mais remotos, cuidando de tomar o rumo da maria virgem.

—Uma noite, entretanto, em que Frei Manuel cumpria sua missão, numa casa de pau-a-pique entre tocatas e danças, apareceu inesperadamente uma escolta. Há quem diga que a escolta, composta de soldados e bate-paus [pessoas comuns que prestam serviços à polícia, como infiltradas], foi logo enveredando para a casa a fim de cercá-la, nada dizendo aos que lá estavam. Segundo quem tal afirma, um do bando atirou em Frei Manuel, de traição, estendendo-o com esse tiro. Outros, porém, juram que os fiéis, já então havidos pela justiça como homicidas e ladrões, resistiram à prisão que lhes era intimada legalmente. 

—O certo é que Frei Manuel, que fechara o corpo a tantos e a tantas, morreu a tiro como qualquer desgraçado que não tivesse embaixadas no céu. E é também certo que seus seguidores, apesar de amedrontados e de andarem numa fuga constante de então para mais tarde, plantaram uma cruz no lugar da morte, rodearam de flores a câmara subjacente a ela e fizeram rodar um cercado." (Silveira, op.cit.). 

Silveira relata que Frei Manuel foi surpreendido por policiais e guarda-costas em uma residência simples, onde foi morto. Seus principais auxiliares, incluindo Francisco Garcia (Chico Gago, depois autodenominado São Sebastião), foram presos, condenados pelo Tribunal do Júri e escoltados para a capital.

—"[E] estiveram dias na penitenciária, donde fugiram facilmente. E São Sebastião, que por último foi condenado e um pouco depois remetido para São Paulo, esse nem chegou a meio caminho: subverteu-se no Turvo, alta noite, escapando aos soldados que o vinham conduzindo, embora a noite fosse escura por demais e o rio crescesse de monte a monte..." (Silveira, op.cit).

O professor e autor santa-cruzense José Ricardo Rios relatou que, na noite de 10 de junho de 1892, soldados da Força Pública de São Paulo estavam em Santa Cruz do Rio Pardo para capturar Frei Manuel. Naquela noite, Antonio Evangelista da Silva, futuro coronel Tonico Lista, matou um soldado e feriu outro gravemente após na zona do baixo meretrício. Devido ao incidente e à morte já confirmada de Frei Manuel, o batalhão não seguiu para São Pedro no dia seguinte (Rios, 2004: 21).

O Correio Paulistano (12/06/1892: 1) noticiou a morte de Frei Manuel:

—"São Pedro do Turvo

—A respeito dos factos gravíssimos que se deram naquela localidade e que foram provocados por um suposto frade, sabemos ter sido o mesmo vitimado pelo povo que desde muito havia sido ludibriado em suas crenças religiosas e escandalizado pelos crimes cometidos pelo falso missionário.

—Seu companheiro de apostolado, o célebre Dr. Barros, conseguiu fugir à vindicta popular."

O citado promotor público identificado apenas como 'Dr. Barros', em todas as citações conhecidas, foi detalhadamente pesquisado pelos autores SatoPrado, a tratar-se de Joaquim Pereira de Barros, bacharel em direito e promotor público na comarca de Santa Cruz do Rio Pardo. Ele exerceu a promotoria, de forma intermitente, em Campos Novos do Paranapanema, que na época era termo da comarca santa-cruzense.

 

 

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O casal de memorialistas Celso Prado e Junko Sato Prado dedica-se à história antiga santacruzense e regional. Com uma densa produção literária, Celso e Junko são responsáveis pelo resgate de episódios e personagens marcantes, além de trazerem à tona informações inéditas a partir de meticulosas pesquisas documentais.
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